Autismo & Cirurgia – que estratégias de preparação?

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As Alterações no Processamento Sensorial são uma condição muito frequente nas Perturbações do Espetro do Autismo (PEA).

Estas alterações afetam a forma como o cérebro das crianças e adolescentes com PEA processa a informação sensorial (entenda-se por informação sensorial as coisas que se ouvem, que se vêm, que se sentem, que se cheiram, que se tocam, que se provam…) acabando por influenciar a resposta comportamental, a resposta atencional e até emocional que dão perante cada situação.

A preparação para uma cirurgia envolve a realização de consultas e exames, momentos de espera, que exigem adaptação, restrições, resposta a situações novas, com várias pessoas e em ambientes diferentes, o que pode causar muito desconforto a uma criança ou jovem com PEA.

Não é simples enumerar estratégias para que esta preparação seja bem sucedida, até porque a replicação ou generalização de uma abordagem estrutural ou comportamental é talvez a menos desejável.

 

Porquê? 

Porque é preciso compreender a singularidade de cada paciente.

1. Enfatizar o envolvimento parental: Os Pais são os melhores consultores/especialistas nas idiossincrasias dos seus filhos.

2. Compreender o paciente: É errado focarmo-nos nos aspetos não-cooperativos. É preciso compreender a raiz dos seus comportamentos.

  • Grau de severidade da PEA
  • Nível de desenvolvimento
  • Particularidades sensoriais (Perfil Sensorial)
  • Nível de comunicação /Linguagem
  • Nível de comprometimento cognitivo

 

 3. O que aprofundar com o seu Psicomotricista?

  • Qual o Perfil Sensorial do seu filho? As alterações no Processamento Sensorial. Enquanto psicomotricistas, quando acompanhamos estes meninos e meninas já os conhecemos profundamente nestas áreas. Temos traçado o seu perfil sensorial, comportamental e desenvolvimental. Partilhar essa informação com a equipa hospitalar pode fazer toda a diferença.
  • Antever o grau de colaboração debruçando-se sobre as suas hipersensibilidades- “alterações no processamento sensorial”, a forma como reage aos estímulos captados pelos seus diversos canais sensoriais: auditivo, visual, vestibular, táctil, sensório-oral, para poder antecipar como reagirá a determinados sons, luzes, movimentos, mobilizações ou até à introdução de sólidos, líquidos intra-orais ou a maneira como reagirá a dispositivos de sedação por via oral e/ou por inalação.
  • Identificar os veículos de comunicação mais eficazes, quer exista ou não linguagem verbal é fundamental, pois ajudará a reduzir o stress e a ansiedade.
  • Identificar os veículos de auto-regulação mais eficazes. Ex.: Algumas crianças/ jovens ficam mais colaborantes e relaxados com música, para outros a música pode ser desconcertante e só conseguirão acalmar-se com o mínimo de ruído.
  • Quais as estratégias que poderão ser mais eficazes?

 

4. “Esculpir” as estratégias

Trata-se de um plano que deve ser pensado em conjunto.

Não esquecendo que “a melhor chave não abre todas as fechaduras”, as estratégias devem ser sempre ajustadas às características desenvolvimentais, comportamentais, sensoriais, comunicacionais e cognitivas de cada paciente.

O que ter em conta?

  • Separação dos pais ou prestadores de cuidados minimizada
  • Alterações de rotina do paciente minimizadas
  • Permitir um objeto da sua preferência, que o ajude a distrair-se /tranquilizar-se
  • Continuidade no diálogo peri-operatório com os pais – além de figura securizante para a criança, são os melhores tradutores do bem-estar da mesma- ajudando a antecipar e reajustar alterações de humor ou de comportamento.

Antecipar

A Familiarização com o espaço e com as pessoas é fundamental (previsibilidade traz segurança). Considerar:

  • visitas prévias ao hospital
  • familiarização com a equipa
  • fotos da enfermeira, da médica, da auxiliar

Admissão

  • Admissão flexível
  • Sala silenciosa
  • Redução dos tempos de espera

Ambiente

  • Intensidade das luzes
  • Controlo de sons, tom de voz, música, ruído
  • Tipo de toque (pressão variável)
  • Temperatura
  • Odores

Comunicação

É importante aprofundar previamente quais os veículos de comunicação mais eficazes a utilizar com o paciente e pelo paciente.

  • Mesmos as crianças que não têm acesso ao uso da linguagem verbal podem conseguir compreender o outro e expressar-se através de veículos alternativos:
    • gestos, ou outras formas não verbais da comunicação, como a expressão facial, o olhar, o sorriso…
    • e/ ou através de sistemas alternativos de comunicação, como cartões de imagens (PECS) ou aplicações em dispositivos digitais.
    • Ser capaz de compreender o que lhe é dito e comunicar as suas necessidades diminui consideravelmente os níveis de stress e ansiedade.

Estratégias de regulação

  • jogos que sejam da sua preferência
  • materiais sensoriais e texturas, que ajudem a acalmar (ex.: recipientes com água, berlindes, feijões),
  • “pequenos tesouros” (transportes, animais ou outros objetos de que goste muito, que estejam visualmente ao alcance mas de difícil acesso, que não obtenham imediatamente- esse tempo de foco atencional nesse objetos, pode ser usado para um procedimento.
  • sacos ou balões com gel, slime, plasticina ou outras texturas
  • movimentos, músicas ou sons que sejam da sua preferência, que captem a sua atenção e que ajudem a reduzir a ansiedade.

Colaboração

  • Para conseguir maior colaboração nas tarefas mais difíceis, é possível realizar uma estratégia cognitivo-comportamental designada de “sequência de pedido de alta probabilidade para pedidos de baixa probabilidade):
    • Trata-se de começar com pedidos de tarefas que a criança goste e responda rapidamente e independentemente, ex.: “vamos bater palmas”, “dá um abraço à mamã”,
    • felicitar/recompensar o paciente por cada pedido correspondido
    • progressivamente avançar para um pedido mais desafiante: ex.: “bate palmas… toma, pega este boneco”
    • precisa sentir-se tranquila e envolvida, antes de podermos fazer um pedido de colaboração mais difícil
  • Usar a modelação para a preparação e previsibilidade dos procedimentos
    • Dependendo do grau de comprometimento intelectual do paciente, é importante mostrar previamente as sequências dos procedimentos que se vão realizar; a equipa pode utilizar um boneco ou pai/mãe/ prestador de cuidados para ensaiar o procedimento que se vai pedir.
    • os pais podem ir “ensaiando” em casa, alguns momento do pré-operatório, por exemplo brincando com um boneco ou entre si, ajudando assim na sensibilização da criança para o dia da cirurgia.

 

É importante ainda considerar as possíveis variações de estratégias de acordo com o grau de severidade das PEA:

  • PEA de alto funcionamento: as estratégias habitualmente mais eficazes incluem: modelagem, escolhas, distração, conversação, sistema de prémios/ recompensas
  • PEA leve a moderado: imitação, escolhas, distração.
  • PEA grave: sequências de pedidos de alta probabilidade para baixa probabilidade, distração com canções ou contagem, contacto físico, abraço e contenção.

 

Não esqueça…

A boa comunicação e colaboração permite:

O conforto da Equipa, a satisfação Parental… e sobretudo… A MELHOR EXPERIÊNCIA PARA O PACIENTE.

Veja publicação Dra Sara Porto Carmo

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